ANC pode perder sua histórica hegemonia na política da África do Sul
O Congresso Nacional Africano (ANC) está prestes a perder nas eleições legislativas da África do Sul a maioria absoluta que detém há 30 anos, segundo a apuração de dois terços dos votos, o que o obrigaria a formar alianças para governar em coalizão.
Com 66% dos votos apurados, o ANC, liderado pelo atual presidente Cyril Ramaphosa, tem 42% dos votos, o que representa o pior resultado desse partido que chegou ao poder em 1994 com o emblemático líder da luta contra o apartheid, Nelson Mandela.
Em seguida, com 22,64%, está a opositora Aliança Democrática (DA, centro liberal) e com 12% o partido Umkhonto We Sizwe (MK), criado há apenas seis meses pelo ex-chefe do ANC e ex-presidente Jacob Zuma, que foi a grande surpresa destas eleições, realizadas na quarta-feira.
Em quarto lugar estão os Lutadores pela Liberdade Econômica (EFF, esquerda radical), com 9,5%, indicou a comissão eleitoral (CEI).
Na província de KwaZulu-Natal, bastião tradicional do ANC, o MK está em primeira posição, com mais de 44% dos votos, frente aos 19% do partido governante.
Os cinco presidentes sul-africanos desde 1994 pertenciam ao ANC.
Naquele ano, nas primeiras eleições após o fim do regime de segregação racial do apartheid, o partido obteve 62% dos votos. E em 2019, nas eleições que levaram Ramaphosa ao poder, 57%.
Se a tendência for confirmada, o ANC terá que abrir negociações para formar um governo de coalizão nesse país de 62 milhões de habitantes.
A participação foi de pouco menos de 60%, menor que das últimas legislativas, em 2019, com 66%.
Os resultados definitivos são esperados até sábado e os 400 deputados da nova assembleia deverão escolher o presidente em junho.
- Coalizões -
O ANC conta na legislatura atual com 230 deputados (57,3%) e deve, apesar de tudo, continuar sendo a maior bancada do Parlamento, mas sem maioria absoluta.
Ramaphosa, de 71 anos, deverá decidir, nesse caso, se busca aliados à direita ou à esquerda do espectro político.
Uma aliança com a DA, liderada pelo político branco John Steenhuisen, poderia enfrentar resistências dentro do ANC.
O programa da DA, que aposta no livre mercado e no fim dos programas de empoderamento econômico da população negra, é diametralmente oposto ao da formação governante.
Firmar uma aliança com o partido de Zuma, de 82 anos, que foi obrigado a renunciar à presidência em 2018 por acusações de corrupção, também se revela difícil.
E tampouco parece fácil uma aproximação com os radicais do EFF de Julius Malema, também ex-militante do ANC, que preconizam a redistribuição de terras à população negra e a nacionalização de setores econômicos chave.
- Erosão da confiança -
Para muitos eleitores, o partido que durante muito tempo encarnou o sonho de acesso à educação, à moradia e a outros serviços básicos, não cumpriu suas promessas.
Sua queda se explica, segundo analistas, pelo aumento da criminalidade, da pobreza e da desigualdade.
Os casos de corrupção que envolvem altos cargos do partido também minaram uma confiança já muito abalada.
A vida cotidiana é ainda afetada por frequentes cortes de água e eletricidade.
L.Bernardi--IM